segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Senha do Mundo

"A Senha do Mundo" é o título de uma das obra de Carlos Drummond de Andrade que compõe a "Coleção Verso na Prosa/ Prosa no Verso" da Editora Record, Rio de Janeiro,1997.
No livro citado, encontramos poemas agrupados em títulos/versos sugestivos, que com eles guardam, não por acaso, estreita relação. Assim, temos em "Compridas Histórias que não Acabam Mais", os poemas: Mulinha, Primeiro automóvel, Infância, Lagoa e Cortesia. Em "Mundo Estreito", temos: Marinheiro, Banho de bacia, Revolta, Esplendor e Declínio da Rapadura, Certas palavras, Brincar na rua e Os grandes. Em "Mais do que um Tesouro" estão os poemas: O doce, Suas mãos, Poema culinário, Tabuleiro e Fruta furto. E, fechando a obra vêm os poemas que dão nome ao livro "A SENHA DO MUNDO". São eles:Distinção, Professor e Palavra mágica.
Ao final do livro há uma biografia de Drummond adaptada ao público infanto-juvenil, o destinatário da Coleção.
Nada mais adequado, a meu ver, do que esta obra, para se introduzir o leitor pré-adolescente ou adolescente no mundo literário de peso como o de Drummond...
Encerrei o ano letivo de 2008, numa solenidade formal em que me despedia de meus, agora ex-alunos, sob a influência destes poemas de Drummond e principalmente do título "A Senha do Mundo".
Para mim, a palavra é a senha do mundo; ela é o aceno, é o sinal; é o gesto ou sinal combinado entre pessoas para se entenderem; é a fórmula convencionada com que alguém indica estar ciente do segredo de certa ação; é a cadeia de caracteres que autoriza o acesso aos segredos disponíveis somente àqueles que a conhecem por meio destes.
A palavra é a senha que autoriza a entrada ao mundo do conhecimento e, conseqüentemente, ao domínio do mundo; quem conhece sabe e quem sabe domina e se liberta, porque sabe do mundo...
Nós, professores, temos essa chave e devemos transferi-la aos nossos alunos, sempre.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Falta a figura masculina

O ensino fundamental caracteriza-se por ser ministrado basicamente por mulheres, e, em BH, não é diferente. Percebe-se maior presença masculina somente ao final do ensino básico (antigas 6ª, 7ª e 8ª séries ou o atual 3º Ciclo de Formação).
Para complicar ainda mais a situação sabe-se que as famílias pobres brasileiras estão sendo levadas adiante e a duras penas, pelas mães e/ou avós; os pais "dão no pé" ao primeiro problema surgido ou nem chegam a assumir o filho.
É comum em sala de aula, ao preencher qualquer questionário ou cadastro sócio-econômico, a criança não marcar nenhuma informação referente ao pai, pelo simples fato de que ele não existe em sua vida. Portanto, cresce e é educada, tanto em casa, quanto na escola, com um mínimo de referência paterna e/ou masculina.
Muitas mães, heroicamente, conseguem desempenhar os dois papéis ( de pai/mãe ) - autoridade, proteção; aconchego, carinho. Estas resguardam seus filhos, bem ou mal, desse déficit da figura masculina. Vale lembrar também que algumas crianças encontram em tios, avós, primos e até mesmo em vizinhos uma referência de pai .
Mas nem sempre isso se dá com todos, e comumente o reflexo dessa falta se materializa na escola na forma de rebeldia, agressividade, falta de limite, revolta, tristeza, depressão.
Não existe mais "O Dia dos Pais" em muitas escolas. Os alunos, geralmente os meninos, não aceitam esse assunto como pauta de estudo ou debate.
Quase todas as vezes que nos deparamos com crianças muito rebeldes, ou deprimidas e investigamos suas vidas,encontramos um comportamento similar com as próprias mães. Elas chegam a nos dizer literalmente: _Não dou conta do meu filho; ele não me obedece; não sei o que fazer... Bota ele de castigo, professora; deixa sem recreio, sem merenda; sem Educação Física... São algumas das soluções que nos dão.
Percebe-se freqüentemente que o aluno ou a aluna que não lidam bem com a mãe ou com os familiares, também não aceita as normas da escola ou da sala de aula. É evidente que o fato de não conviverem com o pai, não explica todos os problemas detectados na vida escolar de uma criança, mas creio que deve contribuir e muito para que eles existam.
Por tudo isso, penso que a predominância da figura feminina, principalmente nos primeiros anos de estudos da criança, não enriquece, nesse aspecto, a sua educação, pois repete-se aí o mesmo discurso, a mesma visão e a mesma forma de se relacionar com o mundo experimentada em casa, a partir da educação dada pela mãe.
Então, o resultado disso tudo é que se não há respeito pela mãe, também não haverá respeito pela professora. Pois ambas potencializam na criança, penso eu, um comportamento mais introspectivo, menos arrebatado, mais castrador, menos arrojado. Então esta se recente disso e não se coloca na vida sob o modelo masculino de ser, visto que o mesmo lhe faltou como alimento emocional e no momento crucial do seu crescimento pessoal, humano, psicológico e social.
Vale pensar a respeito. O que você me diz?

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Pré-adolescentes-adultos

Estou de férias. Ontem tive o último contato com meus alunos e hoje com alguns de seus pais, digo, de suas mães. Minha escola trabalha com alunos de até 12 anos, final do 2º Ciclo; para dar continuidade a seus estudos, são encaminhados a outra escola municipal da região, quando concluem o ensino fundamental, fazendo o 3º Ciclo de Formação.
Na segunda feira realizamos uma solenidade mais formal no auditório da escola para as turmas do final do ciclo que se despediam, a minha inclusa, e, na cantina, após essa solenidade, um lanche com doces, refrigerantes e salgadinhos. Nem todos os meus alunos participaram. Chovia muito e eles preferiram ficar em casa. Aqueles presentes estavam alegres, felizes mesmos; fizeram bonito, comportaram-se adequadamente tanto no auditório quanto na cantina; são aprendizagens de convivência social que somente nestas oportunidades podemos avaliar e nos sentirmos felizes com o amadurecimento deles.
Hoje havia a expectativa do último contato com os pais. Preparei gráficos demonstrando a evolução pedagógica da turma ao longo do ano letivo ; fiz um pacote contendo as avaliações de Língua Portuguesa, Matemática, Geografia, História e Ciências; o Boletim Escolar, uma tabela de notas e conceitos da turma ( onde os pais têm uma visão dos resultados do filho e de cada um dos colegas dele ) na mesma tabela; uma mensagem pessoal de "Feliz Natal" para cada aluno e uma lembrancinha.
Às 8h30min, horário marcado para início da reunião, contava com uma pessoa que se dizia tia de um dos meus alunos e um pai que chegou a seguir. Essa "tia" estava apressada e me perguntou se eu iria falar alguma coisa na reunião; queria só pegar o pacote do sobrinho e ir embora.
Foi um "balde d'água fria"na minha ansiedade! Prepara-me para dizer umas palavras finais aos pais, fazer algumas recomendações, pedir-lhes que não deixassem de incentivar os filhos nos estudos, que os acompanhassem, que lhes dessem apoio, etc, etc, etc...Mas não pude fazer nada disso. Os pais, modo de dizer, as mães, as que compareceram, chegaram aos poucos, todas apressadas... Desisti de falar-lhes, limitei-me a entregar-lhes o pacote de provas e pedir-lhes para assinarem a lista de presença. Aquelas que se mostravam um pouco mais calmas e puxavam algum assunto recebiam de mim a atenção devida, mas sem entusiasmo. Havia um pedido da escola para que avaliassem, por escrito, os trabalhos desenvolvidos com sugestões de melhoras; alguns preencheram essa ficha. No mais, entreguei o restante das provas aos alunos mesmos, aqueles que compareceram, sem os seus familiares. Pedi-lhes que assinassem a lista de presença pelos pais, já que os mesmos abriram mão dessa responsabilidade. Os alunos estranhavam e perguntavam: _ Fessôra, eu posso assinar no lugar da minha mãe?! E eu lhes dizia: _ Não, você vai assinar o seu nome como aluno e por sua mãe ( P/mãe).
Essa foi a última lição deles sob minha responsabilidade: quando os pais deixam de cumprir uma tarefa que é deles, não resta outra saída ao filho do que fazer por eles! É assim que muitos se tornam "adultos" antes da hora.
Segundo o colunista Cláudio de Moura e Castro em seu artigo na edição de Veja dessa semana, os pais dos alunos alunos pobres não valorizam o estudo dos filhos e pouco se importam se estes passam de ano tendo aprendido o que lhes foi ensinado, ou não. Tanto faz. O estudo não é um valor em suas vidas.
É uma pena que seja assim, mas constato esse fato todos os dias, com raras exceções.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Mais um ano letivo que vem

Chego ao final de mais um ano letivo. Ao todo são 13 anos na mesma escola. Passei por outras funções na Rede _ coordenador pedagógico, diretor de escola e finalmente professor; de certa forma fiz um caminho diferente do de outros profissionais; é natural que se comesse como professor para, com o tempo, chegar-se a coordenador e diretor.
Porém, penso que a "ordem dos fatores não altera o produto" e, por ter assumido outras funções antes da sala de aula, hoje posso afirmar com segurança que o lugar que importa mesmo em uma escola é o da sala de aula. É lá que tudo acontece e é por causa do aluno que todos sobrevivemos, temos uma profissão e a oportunidade de exercê-la.
Pena que nem todos os profissionais da educação pensam assim e chegam a afirmar que "a escola seria o melhor lugar do mundo não fossem os alunos que lá transitam para azucrinar a vida de quem nela trabalha".
Parece só mais uma frase de efeito, mas não é. Infelizmente alguns profissionais a levam a sério e o final de ano torna-se um leilão de quem pega os melhores lugares, as melhores turmas, os alunos bonzinhos, os cheirozinhos, os menos levadinhos... E é um tal de eu sou mais antigo portanto tenho o direito de escolher. Escolhe-se aluno como se cata feijão; ninguém se propõe a trabalhar com aqueles considerados "difíceis" e eles sobram como o "jiló na janta", porque sempre ficam com os profissionais que não têm saída, com aqueles que têm algo a perder ,caso não os assumam _ uma dobra, uma escola (se são excedentes ali) ou mesmo uma vaga, se são novatos.
Geralmente o regimento interno das escolas protege os mais antigos dando-lhes a chance da escolha dos melhores postos; poucos são os diretores de escola que fazem valer a lei do bom senso determinando a função e a turma conforme o perfil e a formação do professor.
O clima entre todos se torna tenso e vence quem grita mais, ou o mais antigo e/ou o protegido da direção.
Não há uma política de distribuição de turmas baseada no diálogo, no consenso, na democracia e na competência profissional para tal ou qual função; se há regras, elas são mutáveis conforme a conveniência e o interesse de poucos.
É dessa forma que um novo ano escolar se delineia nas escolas municipais de BH, salvas algumas poucas e raras exceções.
Dois mil e nove ainda nem começou e já está selada a "sorte" de determinados alunos e professores. Aprendizado eficiente? Desempenho pedagógico dos alunos e da escola? Satisfação de alunos e professores em sala de aula? E quem é que se importa com isso?!

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Aceito receitas

Num certo período das Faculdades de Educação, principalmente das Federais, virou moda rotular de pouco criativos aqueles professores que priorizavam o trabalho em sala de aula a partir do uso sistemático do Livro Didático e/ou aqueles que "cobravam" nos congressos, seminários e cursos de formação "receitas" para aulas de Língua Portuguesa, Matemática, Ciências... Sugeriam-lhes, então, que fossem criativos, que cada caso era um caso, que não dava para oferecer receitas de como se "dar aulas", (expressão abominada por esses teóricos) porque "dar aula", diziam eles, não é a mesma coisa que fazer um bolo" e blá, blá, blá.
Tudo muito bem, tudo muito bom! Sim, o professor deve ser o mediador do conhecimento, aquele que propõe, mas que também observa o aluno, ouve e reconhece nele um ser de cultura e de saber, de interesses vários que precisam ser atendidos e transformados em aulas lúdicas, interessantes, estimulantes, criativas, empolgantes, vivas, alegres, inovadoras...
Observo muito as aulas da TV Futura, dos Tele-cursos, das TVs Educativas; observo também os créditos desses programas. Há sempre uma equipe imensa e todos os recursos de imagens, documentários, ilustrações animadas dos conceitos apresentados; dramatizações (feitas por atores profissionais) das situações apresentadas como conteúdos de estudo; entrevistas com os especialistas de cada assunto abordado e visitas aos locais em destaque. Tudo o que eu sonhei e sonho como recurso para as minhas aulas aparece ali materializado na forma de textos e imagens.
Porém, pergunto: o quanto de tempo e o quanto em recursos (humanos e materiais) são gastos na produção desses programas? Eu não sei. Mas sei que para as minhas aulas conto com uma equipe formada por mim e eu mesma; com meus colegas de escola, que vivem nas mesmas condições em que eu; com o meu tempo, que é o de um dia para o outro e com o tempo mais longo, que é o dos finais de semana e feriados; tenho os recursos de televisão e vídeo da escola, que sempre são disputados com os professores das outras turmas; tenho os livros didáticos e outros gêneros, da nossa biblioteca, tenho uma acanhada biblioteca particular, no meu armário de sala de aula (livros guardados em caixas de sapatos) e outros materiais xerocados; uma ou outra excursão, que deve caber no orçamento da escola para tal finalidade e ser distribuído entre todas as turmas; conto com a boa vontade dos vários funcionários da escola, dos próprios alunos e de seus familiares; conto ainda, e não recuso jamais, com as receitas de atividades e de projetos que deram certo em outras turmas ou em outras escolas.
Estou aberta a todas as receitas: novas e velhas também, desde que funcionem é claro! E, por que não?!

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Educação no Brasil:de quem é a culpa?

Li na última edição da Revista Veja (3/12/08) um artigo do articulista Gustavo Ioschpe intitulado "Violência escolar:quem é a vítima"?
O autor em questão comenta alguns fatos relativos ao tema; diz ser contra a toda forma de violência; reconhece que existem indisciplinas nas salas de aula que precisam ser coibidas; compara os casos de violência nas escolas brasileiras aos dos EUA de dez anos atrás e afirma que "aqui no Brasil nós só temos olhos para um lado da violência escolar: aquela dos alunos contra os professores e funcionários".
Comenta ainda que a maioria das nossas escolas está longe de ser refém da criminalidade que aparece nos jornais, pois as estatísticas oficiais, colhidas pelo MEC junto aos professores, pintam um quadro menos sombrio.
Gustavo Ioschpe nos dá a entender que tão grave quanto a violência dos alunos em relação aos professores e funcionários é a violência das escolas, entenda-se aí, dos professores e dos funcionários, contra os alunos. Afirma que essa violência existe, sob vários aspectos, e não alcança a mesma repercussão daquela na mídia.
Cita, no artigo em questão, um estudo da UNESCO, chamado "Repensando a escola", realizado por pesquisadores/observadores, em 225 escolas de dez estados brasileiros. Destaca deste estudo, dentre outras coisas, aspectos que caracterizam a atual escola do país dizendo-nos que: " é uma escola que insiste na disciplina e coíbe a criatividade; onde a pregação ideológica substitui a preocupação com o saber". Mais adiante diz que o estudo comentado constata que na maioria das salas de aula ou dos professores observados "parecia não haver planejamento das aulas e quando havia era pouco estimulante, limitando-se quase que exclusivamente a seguir o livro didático, tornando as aulas enfadonhas e de pouco interesse". Continua destacando o estudo da UNESCO, onde se afirma "serem as aulas monótonas, sem alegria, sem novidades, sem recursos".
Confesso que fiquei sem palavras, sem o que pensar, ou, com muito mais a pensar, pois me reconheço nesse universo e não me sinto nem um pouco à vontade. Também não me sinto culpada ou relapsa, ou omissa ou seja lá que outros adjetivos caibam nessa situação.
Meus colegas professores, muitos deles, são tão preocupados com o caos da educação no Brasil quanto eu, quanto você, quanto Gustavo Ioschpe. Mas o que fazer? Por onde começar? Quando e quem dará o primeiro passo?