segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Senha do Mundo

"A Senha do Mundo" é o título de uma das obra de Carlos Drummond de Andrade que compõe a "Coleção Verso na Prosa/ Prosa no Verso" da Editora Record, Rio de Janeiro,1997.
No livro citado, encontramos poemas agrupados em títulos/versos sugestivos, que com eles guardam, não por acaso, estreita relação. Assim, temos em "Compridas Histórias que não Acabam Mais", os poemas: Mulinha, Primeiro automóvel, Infância, Lagoa e Cortesia. Em "Mundo Estreito", temos: Marinheiro, Banho de bacia, Revolta, Esplendor e Declínio da Rapadura, Certas palavras, Brincar na rua e Os grandes. Em "Mais do que um Tesouro" estão os poemas: O doce, Suas mãos, Poema culinário, Tabuleiro e Fruta furto. E, fechando a obra vêm os poemas que dão nome ao livro "A SENHA DO MUNDO". São eles:Distinção, Professor e Palavra mágica.
Ao final do livro há uma biografia de Drummond adaptada ao público infanto-juvenil, o destinatário da Coleção.
Nada mais adequado, a meu ver, do que esta obra, para se introduzir o leitor pré-adolescente ou adolescente no mundo literário de peso como o de Drummond...
Encerrei o ano letivo de 2008, numa solenidade formal em que me despedia de meus, agora ex-alunos, sob a influência destes poemas de Drummond e principalmente do título "A Senha do Mundo".
Para mim, a palavra é a senha do mundo; ela é o aceno, é o sinal; é o gesto ou sinal combinado entre pessoas para se entenderem; é a fórmula convencionada com que alguém indica estar ciente do segredo de certa ação; é a cadeia de caracteres que autoriza o acesso aos segredos disponíveis somente àqueles que a conhecem por meio destes.
A palavra é a senha que autoriza a entrada ao mundo do conhecimento e, conseqüentemente, ao domínio do mundo; quem conhece sabe e quem sabe domina e se liberta, porque sabe do mundo...
Nós, professores, temos essa chave e devemos transferi-la aos nossos alunos, sempre.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Falta a figura masculina

O ensino fundamental caracteriza-se por ser ministrado basicamente por mulheres, e, em BH, não é diferente. Percebe-se maior presença masculina somente ao final do ensino básico (antigas 6ª, 7ª e 8ª séries ou o atual 3º Ciclo de Formação).
Para complicar ainda mais a situação sabe-se que as famílias pobres brasileiras estão sendo levadas adiante e a duras penas, pelas mães e/ou avós; os pais "dão no pé" ao primeiro problema surgido ou nem chegam a assumir o filho.
É comum em sala de aula, ao preencher qualquer questionário ou cadastro sócio-econômico, a criança não marcar nenhuma informação referente ao pai, pelo simples fato de que ele não existe em sua vida. Portanto, cresce e é educada, tanto em casa, quanto na escola, com um mínimo de referência paterna e/ou masculina.
Muitas mães, heroicamente, conseguem desempenhar os dois papéis ( de pai/mãe ) - autoridade, proteção; aconchego, carinho. Estas resguardam seus filhos, bem ou mal, desse déficit da figura masculina. Vale lembrar também que algumas crianças encontram em tios, avós, primos e até mesmo em vizinhos uma referência de pai .
Mas nem sempre isso se dá com todos, e comumente o reflexo dessa falta se materializa na escola na forma de rebeldia, agressividade, falta de limite, revolta, tristeza, depressão.
Não existe mais "O Dia dos Pais" em muitas escolas. Os alunos, geralmente os meninos, não aceitam esse assunto como pauta de estudo ou debate.
Quase todas as vezes que nos deparamos com crianças muito rebeldes, ou deprimidas e investigamos suas vidas,encontramos um comportamento similar com as próprias mães. Elas chegam a nos dizer literalmente: _Não dou conta do meu filho; ele não me obedece; não sei o que fazer... Bota ele de castigo, professora; deixa sem recreio, sem merenda; sem Educação Física... São algumas das soluções que nos dão.
Percebe-se freqüentemente que o aluno ou a aluna que não lidam bem com a mãe ou com os familiares, também não aceita as normas da escola ou da sala de aula. É evidente que o fato de não conviverem com o pai, não explica todos os problemas detectados na vida escolar de uma criança, mas creio que deve contribuir e muito para que eles existam.
Por tudo isso, penso que a predominância da figura feminina, principalmente nos primeiros anos de estudos da criança, não enriquece, nesse aspecto, a sua educação, pois repete-se aí o mesmo discurso, a mesma visão e a mesma forma de se relacionar com o mundo experimentada em casa, a partir da educação dada pela mãe.
Então, o resultado disso tudo é que se não há respeito pela mãe, também não haverá respeito pela professora. Pois ambas potencializam na criança, penso eu, um comportamento mais introspectivo, menos arrebatado, mais castrador, menos arrojado. Então esta se recente disso e não se coloca na vida sob o modelo masculino de ser, visto que o mesmo lhe faltou como alimento emocional e no momento crucial do seu crescimento pessoal, humano, psicológico e social.
Vale pensar a respeito. O que você me diz?

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Pré-adolescentes-adultos

Estou de férias. Ontem tive o último contato com meus alunos e hoje com alguns de seus pais, digo, de suas mães. Minha escola trabalha com alunos de até 12 anos, final do 2º Ciclo; para dar continuidade a seus estudos, são encaminhados a outra escola municipal da região, quando concluem o ensino fundamental, fazendo o 3º Ciclo de Formação.
Na segunda feira realizamos uma solenidade mais formal no auditório da escola para as turmas do final do ciclo que se despediam, a minha inclusa, e, na cantina, após essa solenidade, um lanche com doces, refrigerantes e salgadinhos. Nem todos os meus alunos participaram. Chovia muito e eles preferiram ficar em casa. Aqueles presentes estavam alegres, felizes mesmos; fizeram bonito, comportaram-se adequadamente tanto no auditório quanto na cantina; são aprendizagens de convivência social que somente nestas oportunidades podemos avaliar e nos sentirmos felizes com o amadurecimento deles.
Hoje havia a expectativa do último contato com os pais. Preparei gráficos demonstrando a evolução pedagógica da turma ao longo do ano letivo ; fiz um pacote contendo as avaliações de Língua Portuguesa, Matemática, Geografia, História e Ciências; o Boletim Escolar, uma tabela de notas e conceitos da turma ( onde os pais têm uma visão dos resultados do filho e de cada um dos colegas dele ) na mesma tabela; uma mensagem pessoal de "Feliz Natal" para cada aluno e uma lembrancinha.
Às 8h30min, horário marcado para início da reunião, contava com uma pessoa que se dizia tia de um dos meus alunos e um pai que chegou a seguir. Essa "tia" estava apressada e me perguntou se eu iria falar alguma coisa na reunião; queria só pegar o pacote do sobrinho e ir embora.
Foi um "balde d'água fria"na minha ansiedade! Prepara-me para dizer umas palavras finais aos pais, fazer algumas recomendações, pedir-lhes que não deixassem de incentivar os filhos nos estudos, que os acompanhassem, que lhes dessem apoio, etc, etc, etc...Mas não pude fazer nada disso. Os pais, modo de dizer, as mães, as que compareceram, chegaram aos poucos, todas apressadas... Desisti de falar-lhes, limitei-me a entregar-lhes o pacote de provas e pedir-lhes para assinarem a lista de presença. Aquelas que se mostravam um pouco mais calmas e puxavam algum assunto recebiam de mim a atenção devida, mas sem entusiasmo. Havia um pedido da escola para que avaliassem, por escrito, os trabalhos desenvolvidos com sugestões de melhoras; alguns preencheram essa ficha. No mais, entreguei o restante das provas aos alunos mesmos, aqueles que compareceram, sem os seus familiares. Pedi-lhes que assinassem a lista de presença pelos pais, já que os mesmos abriram mão dessa responsabilidade. Os alunos estranhavam e perguntavam: _ Fessôra, eu posso assinar no lugar da minha mãe?! E eu lhes dizia: _ Não, você vai assinar o seu nome como aluno e por sua mãe ( P/mãe).
Essa foi a última lição deles sob minha responsabilidade: quando os pais deixam de cumprir uma tarefa que é deles, não resta outra saída ao filho do que fazer por eles! É assim que muitos se tornam "adultos" antes da hora.
Segundo o colunista Cláudio de Moura e Castro em seu artigo na edição de Veja dessa semana, os pais dos alunos alunos pobres não valorizam o estudo dos filhos e pouco se importam se estes passam de ano tendo aprendido o que lhes foi ensinado, ou não. Tanto faz. O estudo não é um valor em suas vidas.
É uma pena que seja assim, mas constato esse fato todos os dias, com raras exceções.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Mais um ano letivo que vem

Chego ao final de mais um ano letivo. Ao todo são 13 anos na mesma escola. Passei por outras funções na Rede _ coordenador pedagógico, diretor de escola e finalmente professor; de certa forma fiz um caminho diferente do de outros profissionais; é natural que se comesse como professor para, com o tempo, chegar-se a coordenador e diretor.
Porém, penso que a "ordem dos fatores não altera o produto" e, por ter assumido outras funções antes da sala de aula, hoje posso afirmar com segurança que o lugar que importa mesmo em uma escola é o da sala de aula. É lá que tudo acontece e é por causa do aluno que todos sobrevivemos, temos uma profissão e a oportunidade de exercê-la.
Pena que nem todos os profissionais da educação pensam assim e chegam a afirmar que "a escola seria o melhor lugar do mundo não fossem os alunos que lá transitam para azucrinar a vida de quem nela trabalha".
Parece só mais uma frase de efeito, mas não é. Infelizmente alguns profissionais a levam a sério e o final de ano torna-se um leilão de quem pega os melhores lugares, as melhores turmas, os alunos bonzinhos, os cheirozinhos, os menos levadinhos... E é um tal de eu sou mais antigo portanto tenho o direito de escolher. Escolhe-se aluno como se cata feijão; ninguém se propõe a trabalhar com aqueles considerados "difíceis" e eles sobram como o "jiló na janta", porque sempre ficam com os profissionais que não têm saída, com aqueles que têm algo a perder ,caso não os assumam _ uma dobra, uma escola (se são excedentes ali) ou mesmo uma vaga, se são novatos.
Geralmente o regimento interno das escolas protege os mais antigos dando-lhes a chance da escolha dos melhores postos; poucos são os diretores de escola que fazem valer a lei do bom senso determinando a função e a turma conforme o perfil e a formação do professor.
O clima entre todos se torna tenso e vence quem grita mais, ou o mais antigo e/ou o protegido da direção.
Não há uma política de distribuição de turmas baseada no diálogo, no consenso, na democracia e na competência profissional para tal ou qual função; se há regras, elas são mutáveis conforme a conveniência e o interesse de poucos.
É dessa forma que um novo ano escolar se delineia nas escolas municipais de BH, salvas algumas poucas e raras exceções.
Dois mil e nove ainda nem começou e já está selada a "sorte" de determinados alunos e professores. Aprendizado eficiente? Desempenho pedagógico dos alunos e da escola? Satisfação de alunos e professores em sala de aula? E quem é que se importa com isso?!

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Aceito receitas

Num certo período das Faculdades de Educação, principalmente das Federais, virou moda rotular de pouco criativos aqueles professores que priorizavam o trabalho em sala de aula a partir do uso sistemático do Livro Didático e/ou aqueles que "cobravam" nos congressos, seminários e cursos de formação "receitas" para aulas de Língua Portuguesa, Matemática, Ciências... Sugeriam-lhes, então, que fossem criativos, que cada caso era um caso, que não dava para oferecer receitas de como se "dar aulas", (expressão abominada por esses teóricos) porque "dar aula", diziam eles, não é a mesma coisa que fazer um bolo" e blá, blá, blá.
Tudo muito bem, tudo muito bom! Sim, o professor deve ser o mediador do conhecimento, aquele que propõe, mas que também observa o aluno, ouve e reconhece nele um ser de cultura e de saber, de interesses vários que precisam ser atendidos e transformados em aulas lúdicas, interessantes, estimulantes, criativas, empolgantes, vivas, alegres, inovadoras...
Observo muito as aulas da TV Futura, dos Tele-cursos, das TVs Educativas; observo também os créditos desses programas. Há sempre uma equipe imensa e todos os recursos de imagens, documentários, ilustrações animadas dos conceitos apresentados; dramatizações (feitas por atores profissionais) das situações apresentadas como conteúdos de estudo; entrevistas com os especialistas de cada assunto abordado e visitas aos locais em destaque. Tudo o que eu sonhei e sonho como recurso para as minhas aulas aparece ali materializado na forma de textos e imagens.
Porém, pergunto: o quanto de tempo e o quanto em recursos (humanos e materiais) são gastos na produção desses programas? Eu não sei. Mas sei que para as minhas aulas conto com uma equipe formada por mim e eu mesma; com meus colegas de escola, que vivem nas mesmas condições em que eu; com o meu tempo, que é o de um dia para o outro e com o tempo mais longo, que é o dos finais de semana e feriados; tenho os recursos de televisão e vídeo da escola, que sempre são disputados com os professores das outras turmas; tenho os livros didáticos e outros gêneros, da nossa biblioteca, tenho uma acanhada biblioteca particular, no meu armário de sala de aula (livros guardados em caixas de sapatos) e outros materiais xerocados; uma ou outra excursão, que deve caber no orçamento da escola para tal finalidade e ser distribuído entre todas as turmas; conto com a boa vontade dos vários funcionários da escola, dos próprios alunos e de seus familiares; conto ainda, e não recuso jamais, com as receitas de atividades e de projetos que deram certo em outras turmas ou em outras escolas.
Estou aberta a todas as receitas: novas e velhas também, desde que funcionem é claro! E, por que não?!

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Educação no Brasil:de quem é a culpa?

Li na última edição da Revista Veja (3/12/08) um artigo do articulista Gustavo Ioschpe intitulado "Violência escolar:quem é a vítima"?
O autor em questão comenta alguns fatos relativos ao tema; diz ser contra a toda forma de violência; reconhece que existem indisciplinas nas salas de aula que precisam ser coibidas; compara os casos de violência nas escolas brasileiras aos dos EUA de dez anos atrás e afirma que "aqui no Brasil nós só temos olhos para um lado da violência escolar: aquela dos alunos contra os professores e funcionários".
Comenta ainda que a maioria das nossas escolas está longe de ser refém da criminalidade que aparece nos jornais, pois as estatísticas oficiais, colhidas pelo MEC junto aos professores, pintam um quadro menos sombrio.
Gustavo Ioschpe nos dá a entender que tão grave quanto a violência dos alunos em relação aos professores e funcionários é a violência das escolas, entenda-se aí, dos professores e dos funcionários, contra os alunos. Afirma que essa violência existe, sob vários aspectos, e não alcança a mesma repercussão daquela na mídia.
Cita, no artigo em questão, um estudo da UNESCO, chamado "Repensando a escola", realizado por pesquisadores/observadores, em 225 escolas de dez estados brasileiros. Destaca deste estudo, dentre outras coisas, aspectos que caracterizam a atual escola do país dizendo-nos que: " é uma escola que insiste na disciplina e coíbe a criatividade; onde a pregação ideológica substitui a preocupação com o saber". Mais adiante diz que o estudo comentado constata que na maioria das salas de aula ou dos professores observados "parecia não haver planejamento das aulas e quando havia era pouco estimulante, limitando-se quase que exclusivamente a seguir o livro didático, tornando as aulas enfadonhas e de pouco interesse". Continua destacando o estudo da UNESCO, onde se afirma "serem as aulas monótonas, sem alegria, sem novidades, sem recursos".
Confesso que fiquei sem palavras, sem o que pensar, ou, com muito mais a pensar, pois me reconheço nesse universo e não me sinto nem um pouco à vontade. Também não me sinto culpada ou relapsa, ou omissa ou seja lá que outros adjetivos caibam nessa situação.
Meus colegas professores, muitos deles, são tão preocupados com o caos da educação no Brasil quanto eu, quanto você, quanto Gustavo Ioschpe. Mas o que fazer? Por onde começar? Quando e quem dará o primeiro passo?

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Aluno especial

Ninguém, a não ser quem está lidando diretamente com o caso, sabe o que significa trabalhar com um aluno que demanda outros cuidados para além dos pedagógicos.
Trabalho, neste ano, com um aluno, que desde o início, em fevereiro, chamava a minha atenção devido à sua total inquietação e alto nível de ansiedade, em sala de aula.
Ele é pouco desenvolvido fisicamente para a idade , 11 anos - altura e massa corporal - é extremamente agitado, falante, voz estridente e alta. Toma o turno da fala de qualquer um seja colega ou professores; responde sempre em primeiro lugar, não importa se corretamente ou não; ninguém tem vez com ele; é o primeiro e o único a ler, a responder a qualquer questão, a fazer qualquer atividade. Basta-me começar a perguntar "quem quer fazer..." e ele logo toma a frente!
Incomoda muito, essa atitude dele, a mim como professora e aos colegas como participantes do mesmo grupo e portanto com os mesmos direitos. Porém, não atinava muito bem, com o motivo que o levava a ser tão egoísta!
Sempre procurei entendê-lo e controlá-lo da melhor forma possível e me colocava como mediadora dos conflitos surgidos em sala, por causa dele.
Até que um dia, tudo começou a ficar mais claro. Num determinado instante do primeiro semestre letivo, o aluno em questão, entrou em convulsão, enquanto fazia o "Para Casa"; relato de uma parente que o acompanha.
Levado ao médico e muitos exames depois ficou diagnosticado ser o aluno portador de uma espécie de aneurisma cerebral; a indicação de tratamento é cirúrgica e com poucas chances de sucesso, segundo relatos familiares. Ainda segundo os médicos, relato da família, a agitação e a ansiedade em demasia do aluno se explica por aí. A pedido do médico neurologista, fala da família, o aluno precisa ser estimulado a participar das aulas, a escrever com legibilidade ( a letra dele é quase ilegível) e a ter limite; precisa ser contido nos seus impulsos... Passou a tomar uma medicação ante convulsivante; a qualquer momento ele pode entrar em crise e precisa ser socorrido imediatamente. Nesse caso, ser encaminhado com urgência ao hospital para uma cirurgia de emergência , de altíssimo risco e alta probabilidade de não dar certo...

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Escola Plural:um outro olhar

Em novembro de 2004, estava eu na direção eleita de uma das escolas da Rede, quando fui surpreendida pela então nova "Proposta Político-Filosófica de Ensino", da Rede Municipal, denominada Escola Plural". Ouvira, naquele instante e pela primeira vez a denominação "Escola Plural". Estranhei o nome e estranhei mais ainda a forma como tal projeto chegava até mim.
Na semana seguinte, recebi uma convocação da SMED "Secretaria Municipal de Educação" para tomar conhecimento oficial da nova proposta de escola para a Rede. Achei o fato tão grave e ao mesmo tempo tão insólito que não quis participar sozinha desse evento. Levei comigo, para a reunião de apresentação da nova escola, todos os professores do turno da tarde, horário do evento.
O então Secretário Adjunto da Educação Municipal, Professor Miguel Arroyo, iniciou sua exposição dizendo-nos que a nova proposta de política educacional municipal surgira dos movimentos educacionais da própria rede e que aquele documento nada mais era do que o reflexo de tais movimentos.
Faz-se necessário esclarecer, porém, que as décadas de 80/90 caracterizaram-se por movimentos em prol de uma educação mais global, participativa, progressista, construtivista e desenvolvida a partir de projetos pedagógicos, que atendessem às necessidades e à cultura dos alunos e das comunidades nas quais as escolas se encontravam. Cada escola era incentivada a ter o seu "Projeto Político Pedagógico" e os professores recebiam onorários, extra grade curricular, para desenvolver tais projetos. No entanto, nem todas as escolas chegaram a ter aprovados, pela Prefeitura, seus projetos, pois isso dependia fundamentalmente do nível de organização política e pedagógica de cada uma delas.
Pode-se depreender daí que assim como em cada sala de aula há grupos diferenciados de alunos e por "n" motivos essa heterogeneidade se estabelece, assim também, acontece em relação às escolas. Desta forma, é fato que um grupo de escolas da época estava bastante avançado nas discussões concernentes à sua organização administrativo-pedagógica; outro grupo estava a meio caminho nessas mesmas discussões e outras tantas escolas não havia alcançado qualquer nível mais sistematizado de organização político-pedagógica.; trabalhavam segundo os moldes tradicionais e cristalizados de um ensino mecânico e sem sentido para o aluno.
Pois bem, veio a "Escola Plural" e nivelou tudo por baixo. Jogou no mesmo balaio as escolas de ponta, as intermediárias e as alienadas e/ou tradicionais no que esse termo tem de negativo...
Tomamos conhecimento do projeto em novembro de 94 e em fevereiro de 95 já estávamos praticando a "Escola Plural". Tivemos uma semana de treinamento no final do mês de janeiro/início de fevereiro. De uma hora para outra, não tínhamos mais: a referência da seriação, a referência curricular, a referência do tempo de permanência com o aluno em sala de aula, a referência de quem trabalharia o que com os alunos. Deveríamos adotar o método de trabalho por projetos a chamada "Pedagogia de Projetos" sem termos sido treinadas,para tal, sem sequer sabermos, muitos de nós, do que se tratava. Aqueles(as) mais curiosos(as) ou mais antenados(as) é que tomavam a frente na distribuição das tarefas entre os professores e levavam para a escola textos referentes à "Pedagogia de Projetos". Ah! Não seria mais de bom tom ficarmos atrelados a conteúdos, a livros didáticos; cartilhas, "nem pensar"! E reprovar o aluno ao final do ano, por não ter aprendido o que deveria, tornou-se ilegal - a Escola Plural não nos permitia isso. Ficamos assim, batendo cabeça, durante todo o ano de 95/96 e porque não dizer, até hoje! A escola virou um caos, ninguém sabia mais como desenvolver seu próprio trabalho. Jargões da função como "dar aula, dar notas pelos trabalhos dos alunos, ensinar a ler, ensinar a escrever, usar a cartilha ou o pré-livro, ou o primeiro livro de leitura, ensinar a tabuada da multiplicação e da divisão, dar ditado para avaliar o padrão ortográfico dos alunos, tomar a leitura do aluno", dentre outros, até então tão familiares a nós, tornaram-se verdadeiros palavrões, rótulos de professores tradicionais, etc, etc, etc...
Hoje, leio os jornais estarrecida pois estes nos dão a entender, nas matérias que tratam do assunto, que a "Escola Plural" foi obra de professores que de repente, na Rede toda, deixaram, por um capricho qualquer, de avaliar seus alunos e dar uma nota por seus trabalhos e, pior ainda, "passavam os alunos de um ano para o outro sem saber nada"! Em nenhum momento leio a verdadeira história da implantação desse projeto na RME.
Em nenhum momento se esclarece ou se afirma que os professores são reféns da chamada "Escola Plural", assim como os alunos e seus familiares.
Sim, na verdade somos todos reféns das políticas educacionais implantadas pelos políticos de plantão e seus administradores públicos.

sábado, 22 de novembro de 2008

Resultados Subjetivos

A magia de uma sala de aula se estabelece quando percebemos, de repente, o crescimento intelectual , emocional e de interação social dos nossos alunos. Isso é mágico porque não é mensurável. Não se faz, ainda, creio eu, uma avaliação objetiva e se distribui pontos para o "amadurecimento emocional, ou intelectual, ou social do aluno". Nesse tipo de avaliação o instrumento de que o professor se vale está contido nele mesmo. Ou seja, isso exige um professor atento, observador, que interage com seus alunos e que consegue, aos poucos, muito lentamente e ao longo do ano letivo ganhar a sua confiança, para que ele, aluno, possa desabrochar.E é de repente, que aquele aluno caladinho, lá do canto da sala, começa a se expressar; faz perguntas pertinentes, interessa-se pelo assunto em pauta, dá palpites; não se sente mais constrangido com o fato de responder e errar, pois entendeu, a partir de um trabalho do professor, que a sala de aula é o lugar para errar, caso contrário, ninguém precisaria estar ali.
Esse trabalho de fazer o aluno se sentir bem, confortável na sala de aula, a ponto de se expor e ter o respeito dos colegas é dos mais sublimes que um professor pode e deve fazer, porque mexe na auto-estima do aluno. E aluno confiante e ao mesmo tempo curioso e desejoso de aprender é tudo que um professor almeja e aprecia ter.
Nesse sentido, também o conteúdo trabalhado ajuda a aguçar a curiosidade do aluno. Não há nada melhor numa turma de pré-adolescentes do que o conteúdo de ensino relacionado à "Origem do Universo"; "Origem da Vida" ou a "Origem e Evolução do Homem na Terra", pois é a partir daí que o mundo se abre para eles. É nesse exato momento que percebem que o mundo não se constitui somente da casa, família, bairro, escola; existe muito mais a ser descoberto e explorado...
Essas aulas se tornam tão intensas na sala que obriga um controle da turma absoluto por parte do professor tantas são as perguntas, tantos são os casos que os alunos querem contar, tantas são as trocas de experiências entre eles.
No começo desses estudos pode-se perceber a confusão que reina na cabecinha de cada um: mundo, universo, país, bairro, cidade, estado, capital, parece ser tudo uma coisa só e tudo isso foi criado por Deus e ponto final. Mas com o desenrolar das aulas e a apresentação das diversas teorias da origem do universo (criacionismo e evolucionismo, por exemplo) algo ilumina os olhinhos e parece que passam a enxergar e a pensar em coisas que jamais haviam pensado antes. Começam, então a duvidar e a questionar;as aulas se tornam, assim, momentos de debates quentes entre todos...
Percebo o mesmo envolvimento em relação à leitura e ao gosto de ler para a fruição, para o prazer, quando inicio as leituras de "Contos Infantis" ( as versões originais), as leituras das histórias de Monteiro Lobato - Histórias do Mundo para Crianças, O Sítio do Pica-Pau-Amarelo, Reinações de Narizinho, As Histórias de Pedrinho ou Reinações de Emília - imediatamente o interesse deles em pegar esses livros na Biblioteca da escola para ler de novo em casa, se manifesta. Nesses momentos eu me sinto feliz e realizada como professora; sinto que é aí que faço a diferença para eles, é aí que deixo a minha marca em suas vidas, pois percebo, embora isso não se reflita de imediato nas avaliações mais objetivas do trabalho pedagógico, que a vida deles e a percepção que têm do mundo se modifica, se transforma nesses momentos de aula. O registro delas se faz na alma, na emoção e não no caderno ou na prova escrita.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Alunos inquietos: o que isso quer dizer?

Hoje percebi que um de meus alunos estava mais inquieto do que o de costume; mal entramos para a sala e ele já saiu para ir ao banheiro. Faz parte dos nossos "combinados de sala"(regras de funcionamento interno da sala) a permissão para sair da sala e ir ao banheiro ou tomar água sem a necessidade de pedir à professora, desde que: saia um aluno de cada vez; sem perturbar o andamento da aula; sem demorar lá fora mais que o necessário; sem perturbar as outras turmas ao transitar pelos corredores da escola. Isso vem sendo mais ou menos seguido, porém eu me obrigo a estar sempre atenta à essa movimentação; quando necessário, havendo abuso de liberdade, intervenho condicionando as saídas à minha permissão.
Alguns alunos, repetidamente, transgridem as regras estabelecidas, preocupando-me.
É sabido por todos que lidam com pré-adolescentes e adolescentes que essa faixa etária caracteriza-se pelo corte do "cordão umbilical" com a família; pela descoberta de que o mundo vai muito além do "portão de casa"; pela descoberta de que os pais não são os "donos da verdade"; pela necessidade de transgredir o estabelecido e, principalmente, de criar laços com o grupo, fazer parte de uma tribo e segui-la fielmente.
Determinados alunos dessa idade são mais influenciáveis que outros, os meninos são mais rebeldes que as meninas e se dispõem a experimentar as novidades mais afoitamente, sem muita ou nenhuma reflexão, quanto às possíveis conseqüências de seus atos.
Descoberta do corpo, descoberta do outro e descoberta do prazer via "amassos", "ficar" e/ou via a experiência com a droga.
Eu, pessoalmente, não tenho nenhuma formação específica para lidar com a questão do uso da droga , por exemplo, mas sei, no caso específico dos meus alunos, que eles fazem parte da população de risco e de vulnerabilidade social e que estão expostos às drogas, por habitarem uma região, onde, comprovadamente, há tráfico de drogas e "guerra" entre líderes para o controle desse tráfico.
Pois bem, meu aluno chegou agitado além do normal, esfregando os olhos a todo o momento, olhando para mim e me "encarando" como se eu fosse sua "inimiga", respondendo-me grosseiramente a qualquer observação minha em relação à ele e, principalmente, fazendo gestos e barulhos na sala de aula, sem o menor pudor ou auto-controle.
Chamei-o em particular e conversei abertamente com ele sobre minhas suspeitas e preocupações; falei-lhe claramente e objetivamente sobre o uso de droga e minhas suspeitas relativas a ele.
Olhou-me atentamente nos olhos, não disse nem que sim e nem que não; voltou para a turma mais tranqüilo, porém às vezes sonolento, "lerdo"; às vezes agitado, passando a mão pelo rosto e pela cabeça em movimentos circulares; mais calado... Porém...

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Ensino Fundamental

Uma das funções precípuas do ensino fundamental (faixa etária de 6 a 14 anos) é ensinar a ler e a escrever. São habilidades distintas que exigem muito conhecimento por parte do professor alfabetizador e muito esforço por parte dos alunos. Porém, quem não lida diretamente com esse assunto, quem não é do meio, tende a achar que o ensino/aprendizagem da leitura e da escrita é algo fácil e rápido. Ledo engano! Principalmente, porque, a alfabetização e o ensino público de um modo geral é terra de ninguém. Existem mil teorias a respeito, as ideologias campeiam e, como no futebol, todos se acham no direito de dar palpites.
Aliás, a educação escolar e a função de professor é dos poucos ofícios que sofre uma enorme pressão por mudanças, vindas de todos os lados; muitas críticas e nenhuma ou quase nenhuma ajuda . Já virou senso comum o pensamento de que aos professores e somente à eles cabe o ônus do fracasso escolar em todos os tempos. Esquecem-se, aqueles que assim pensam,de que tanto o professor quanto o aluno são sujeitos de um mesmo processo; ambos sofrem com as ocorrências sociais e pessoais diárias e levam consigo , para as salas de aula, toda a carga dessas interferências.
Por outro lado, não se pode negar que existem papéis a serem cumpridos e responsabilidades a serem assumidas, de ambos os lados.
Como já foi dito acima, aprender as habilidades da leitura e da escrita não é algo simples, rápido e fácil; exige preparo técnico, emocional e social, por parte do professor, e , por parte do aluno,exige: vontade de aprender, motivação, valorização do estudo, suporte familiar e social, boa saúde e predisposição para estudar. Sem esses ingredientes, de ambos os lados, pouco se pode alcançar.
Está claro de que não se pode esperar as condições ideais para então agir, mas é óbvio também que sem o mínimo de interesse pelo estudo, e pelo trabalho que é ensinar/aprender, pouco se consegue.
Faz-se necessário, então, acredito eu: apoio, suporte, acolhimento e interesse sincero aos elos fundamentais da corrente que se chama ensino básico ou fundamental.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Professores Ignorados

Há tempos que trabalho em educação. Quando entrei pra RME, aos 23 anos de idade, já assumi de cara, uma função mediadora entre professores, alunos e direção da escola, e/ou, professores, alunos e pais. Há época, exercia a função de "Supervisor Pedagógico". Acabara de me formar, estava no início de minha carreira profissional, no início da construção de minha família e cheia de energia e entusiasmo.
Não entendia muito bem quando minhas colegas, mais antigas que eu na profissão, manifestavam-se seticamente a respeito das novas políticas educacionais, dos novos planos para salvar o ensino básico, dos novos métodos para ensinar a ler e a escrever.
Neste período decorrido, passei por vários destes planos ou destas reformas do ensino. Desde aqueles que consideravam que as crianças não aprendiam a ler por causa do "Método Global de Contos", Pré-livro "Os Três Porquinhos", da educadora Lúcia Casasanta, até àqueles que consideravam que o problema da não aprendizagem dos alunos estava no fato de eles irem "com fome" para a escola. Então, "vamos dar comida para eles"!
Na escola onde trabalhava nesta época, os alunos recebiam um copo de leite à entrada do turno, almoço antes do início das aulas e, quanto ao método de ensino da leitura e da escrita, mudara para o "Método Fônico", Cartilha "Acorda Dorminhoca".Tivemos, posteriormente, o período do "Construtivismo", teoria da educadora Emília Ferreiro e outras/os; outras formas de intervenção foram/são: doação de livros didáticos aos alunos, dicionários, material escolar completo e kit" literatura, composto pelos autores de sempre...
Na verdade, de lá para cá, nada ou quase nada mudou. As intervenções políticas, ideológicas e oportunistas no processo de ensino-aprendizagem dos alunos, continuam acontecendo e os professores, nesse imbróglio todo, são praticamente ignorados. Jamais foram ou são consultados sobre o que mudar, por que mudar, onde mudar e como mudar.
Sempre fomos tratados como a peça de menor importância na engrenagem educacional e o somos até hoje. O máximo que fazem os "Secretários de Plantão", e quando o fazem, é comunicar às escolas de que tal ou qual "Seminário, Encontro, Congresso" seja lá o que for, irá acontecer e, as escolas que "se virem nos trinta" para propiciar ao professor (em pleno período letivo) a oportunidade de participar. Eu mesma já participei de alguns desses eventos, mas normalmente, o que se faz lá é referendar aquilo que já foi acordado em reuniões fechadas e para poucos.
Resultado disso? Provavelmente uma parcela substancial da culpa de o ensino público atual estar no fracasso de que todos sabemos.

Tempo de avaliação

Queiramos ou não, final de ano nos obriga a avaliar não só as nossas ações pessoais, as de caráter particular, bem como as de cunho profissional.
Nesse ofício de professor nos enchemos das melhores expectativas ao se iniciar cada ano letivo e estas vão se amofinando, vão murchando, vão minguando à medida que o tempo passa e nos deparamos com o fracasso de nossos alunos.
Alguns de seus progressos são perceptíveis somente para nós, professores, mas não são mensuráveis objetivamente, porque fazem parte do desenvolvimento subjetivo de cada um .
Outras aprendizagens ,mais perceptíveis ,como alcançar proficiência em leitura e escrita, por exemplo, nos frustram , pois às vezes a evolução alcançada pelo aluno é tão pequena, a mudança percebida entre aquilo que já dominava e o que passou a dominar, após um ano de trabalho, nos parece tão insignificante ,diante do que esperávamos ,que só nos resta lamentar e tentar buscar de quem foi a culpa. Quanto trabalho, quanta expectativa, quanto desgaste do aluno, do professor e dos pais, diante de uma página cheia de incoerências, de inadequações, de falta de percepção do significado do ler e do escrever.
O que fazer? Não há tempo para mais nada. O que deu errado? Por que não houve a aprendizagem esperada?

Escola Teatro e Esporte: uma bela e possível parceria

Hoje, todos os alunos da minha escola foram ao teatro. Assistimos a uma peça "A Bela e a Fera", na versão clássica, original, e que foi do agrado de todos.
Os atores conseguiram, por quase 1h, manter mais de 400 alunos, faixa etária entre 9 e 13 anos de idade, atentos e interessados. Ouvia-se, a cada mudança de cenário, a cada mudança de roupa das personagens, a cada fala mais enfática os sinais da aprovação dos alunos.
Há muito que se sabe da importância da parceria artes/esportes e o ensino acadêmico.
Penso que todas as escolas, públicas ou privadas ,deveriam contar , rotineiramente, com uma estrutura paralela, mas presente em cada unidade de ensino , de profissionais das artes e dos esportes: música, dança, teatro, artes plásticas, dentre outras e as modalidades esportivas mais do gosto dos alunos, para, em parceria com o ensino acadêmico, formá-lo na sua totalidade.
O interessante é que essa idéia não é nova e nem é minha. Ela está presente nos programas de ensino nacionais de no mínimo 30/40 anos atrás. Porém, a vontade política para torná-la real nas escolas é que inexiste até hoje, infelizmente. Pobre Brasil! Pobres de nós conformados e submissos cidadãos.

Paulo Freire: educador genial.

Dia desses, relendo a obra de Paulo Freire "Pedagogia da Autonomia: Saberes Necessários à Prática Educativa" pude observar que seu poder de síntese, de concisão é tão grande, suas idéias a respeito da relação professor/aluno são tão intensas que já se fazem presentes nos títulos e subtítulos de cada capítulo da obra citada. Se não, vejamos: a obra citada acima se subdivide em três capítulos e estes em subtítulos.
No primeiro capítulo, o autor discorre sobre o tema principal intitulado "Não há docência sem discência" e, numa linguagem característica e coloquial, puxa o leitor para reflexões sobre a imprescindível relação professor/aluno no processo ensino/aprendizagem, quando diz que ensinar exige rigorosidade metodológica; exige pesquisa; exige respeito aos saberes do educando; exige criticidade; exige estética e ética; corporificação das palavras pelo exemplo; exige risco, aceitação do novo e rejeição a qualquer forma de discriminação; exige reflexão crítica sobre a prática. Para ele, ensinar exige o reconhecimento e a assunção da identidade cultural.
No capítulo 2, evidencia a relação professor/conhecimento e as responsabilidades dos mestres, diante da classe, no manejo dos conteúdos trabalhados com os alunos. Intitula-se o capítulo: "Ensinar é não transferir conhecimento", pois, segundo afirma, ensinar exige consciência do inacabado; exige o reconhecimento de se ser condicionado; exige respeito à autonomia do ser do educando; ensinar exige bom senso; exige humildade, tolerância e luta em defesa dos direitos dos educadores; ensinar exige apreensão da realidade; exige alegria e esperança; exige convicção de que a mudança é possível, exige curiosidade por parte do professor.
Por fim, no terceiro capítulo, reafirma a convicção de que "Ensinar é uma especificidade humana", e, portanto, exige segurança, competência profissional e generosidade; exige comprometimento e compreensão de que a educação é uma forma de intervenção no mundo.
Paulo Freire afirma, ainda, que ensinar exige liberdade e autoridade; exige tomada consciente de decisões. Ensinar exige saber escutar e saber que a educação é ideológica; exige disponibilidade para o diálogo.
Por fim, ensinar exige querer bem aos educandos.
Genial! Grande responsabilidade a nossa.
E você, o que pensa a respeito?

Dia Morno

Trabalhei com sete alunos em sala! Dia chuvoso, segunda-feira, horário de verão, final de ano... Tudo isso é motivo para que o aluno não apareça na escola. E, aqueles que vão, pressionam para que não se dê aula! Eles dizem assim: "Ô, fessoôra! Vão ver um filme"...
Argumentei com eles de que eu não esperava tantas ausências, de que não gostaria de passar filmes ou vídeos só para "tampar buracos", digo que em respeito ao esforço deles de terem ido à aula apesar da chuva, do horário de verão, etc, fazia questão de manter o planejamento do dia. Mas nada adiantou. Eles se mantiveram insatisfeitos o tempo todo! Fizeram de tudo para desviar o rumo das aulas de História, Língua Portuguesa e Matemática previstas no horário. Praticamente não renderam nada. Por fim, eu também fiquei desmotivada pois pensava nos alunos ausentes e no fato de, caso avançasse com o conteúdo como era minha intenção, eles ficariam prejudicados por não estarem ali. De qualquer forma a aula teria que ser reposta para eles. Assim, entre a cruz e a espada, passei por mais um dia de trabalho.

Tempo Escolar

Tempo, substantivo masculino, apresenta vários conceitos, nos remete a várias idéias e situações. Tempo pode ser: duração calculável dos seres e das coisas; duração limitada; sucessão de dias, horas momentos; período; época; estado atmosférico; os séculos; ensejo; estação ou ocasião própria, dentre outros conceitos.
A escola lida com o tempo nos seus mais diversos conceitos: há o ano letivo a ser cumprido legalmente, segundo Lei Federal - o ano escolar dura no mínimo 280 dias letivos. Esses dias são distribuídos ao longo do ano conforme orientação das "Secretarias de Educação", sejam elas municipais, estaduais ou do ensino privado. Nesse particular o Brasil é um dos países de menor carga horária no mundo.
Pois bem, todas as escolas organizam o trabalho pedagógico a ser realizado tendo por parâmetro de tempo o "Calendário Escolar". Dessa forma, quanto mais organizada é uma escola, maior a otimização do seu tempo escolar. Mas isso demanda um projeto pedagógico bem definido, metas educacionais claras, objetivas, planejamentos prévios de cada uma das etapas do ano escolar e dos trabalhos a serem desenvolvidos por alunos, professores, corpo técnico da escola, demais funcionários e familiares dos alunos.
A escola que não se organiza dessa forma, perde-se no "apagar incêndios" do dia-a-dia e, ao final do ano letivo, colhe frustrações, cansaço, baixo rendimento dos alunos e conseqüentemente de toda a sua equipe pedagógica ; e, por que não dizer, também dos funcionários e dos pais dos alunos. Não havendo um planejamento e, a partir daí, um controle rígido das ações pedagógicas da escola, o que impera é o espontaneísmo, são as atividades sem conseqüência na aprendizagem dos alunos ou, pior ainda, é a perda da oportunidade de aprender...
Vivo isso e constantemente me pego discutindo com meus pares a urgência de um maior controle das nossas ações, mas são tantas as desculpas, são tantos os entraves, são tantas as situações de abandono dessa idéia - de melhor e maior aproveitamento do tempo escolar, via planejamento pedagógico, planejamento administrativo, que já nem sonho mais com tal organização.
Para mim, o que distingue a escola pública da escola particular não é a clientela, não é o professor, mais ou menos preparado para exercer o seu ofício, mas sim, a capacidade de organização, de liderança e de planejamento da ação pedagógica em cada unidade escolar.
O tempo escolar é sagrado, escasso e não deveria ser negligenciado como vejo acontecer com tanta freqüência.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Democracia e sala de aula

Sou democrata e assim procuro viver independentemente do lugar onde esteja nas minhas relações interpessoais. Ouvir as pessoas, buscar-lhes a razão e o que pensam; colocar-me no lugar delas, para então decidir por esse ou aquele ato, por esta ou aquela opção dá trabalho, mas compensa pois é assim que entendo o respeito às pessoas e a mim mesma em cada situação de convivência seja ela familiar, profissional ou social.
Assim, conduzo minhas aulas baseada na força do diálogo: apresentar o problema ou a situação de estudo; ouvir o que os alunos têm a dizer a respeito; e, a partir daí, estabelecer com eles diálogos sobre a temática em evidência, até chegarmos, juntos, aos conceitos já estabelecidos, e/ou às idéias construídas por eles, naquele momento, é uma das metodologias de trabalho utilizadas por mim, em sala de aula.
Porém, tudo que envolve fala na expressão de idéias, envolve também paixão, entusiasmo, emoção e... barulho, muito barulho! Sim, minhas aulas são barulhentas; meus alunos falam, defendem seus pontos de vista, fazem perguntas para esclarecimentos e perguntas questionadoras: daquelas que implicam, muitas vezes, em tremendas "saias-justas" para a professora.Essa é uma das formas mais difíceis, acredito eu, de conduzir uma aula, pois tanto pode proporcionar momentos mágicos de aprendizagens para todos, quanto pode cair num desvio total de rumo e se perder do seu objetivo inicial. Exige do professor muita segurança não só do conteúdo em pauta, mas também, na escuta do aluno, na filtragem imparcial daquilo que é pertinente ao momento da aula e na mediação segura do tema e do tempo disponível ,conforme o horário das aulas a ser cumprido. Vivemos situações enriquecedoras, de pura vibração quando tudo dá certo e momentos de loucura quando perdemos o controle da discussão e da turma. Isso, porque, há em sala de aula, várias situações de trabalho: apresentação do tema, desenvolvimento do assunto, estudos, leituras e pesquisas a respeito, sistematização do estudo e avaliação da aprendizagem. Ao ser professora de cinco disciplinas em uma mesma turma preciso de um controle enorme sobre as situações de ensino vivenciadas de acordo com a disciplina desenvolvida e o momento pedagógico de cada uma, ou seja, é comum estar introduzindo um estudo de Matemática, desenvolvendo um outro de Língua Portuguesa, sistematizando um tema em História e avaliando um estudo já realizado em Geografia em um único dia de trabalho!
Saio da sala, todos os dias, exaurida! A sensação é a de ter praticado quatro horas e meia de exercícios físicos intensos e sem descanso; quando tudo corre bem - alegria, entusiasmo, vibração, quando perco o controle e sinto que nada foi bom - frustração, tristeza, fracasso!
Vivo isso intensamente, todos os dias, há 13 anos. É a minha adrenalina.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

O Professor Está Só

Trabalhamos sós. Precisamos urgentemente do diálogo com os outros profissionais da saúde, da assistência social e da cultura para nos dar o suporte necessário ao trabalho pedagógico que realizamos com e para os alunos.
Menino doente não aprende. Falo das doenças do corpo, da alma e da sociedade.
Professor doente não ensina: doença do corpo, da alma e social. E mais, sociedade da era da comunicação não pode admitir o isolamento profissional: a falta de interação com os outros órgãos de assistência social, humana, psicológica e cultural, em benefício de alunos e professores.
Como obter o rendimento escolar desejado, de alta qualidade, com criança que se queixa de dor de dente, dor de cabeça, de desânimo! Como obter o tão almejado rendimento escolar de crianças infreqüentes, desatentas, dispersas... Não há o que fazer por elas? Somente o professor e a escola são os responsáveis por este estado de coisas?
Houve um tempo na Prefeitura que contávamos com médicos, psicólogos, dentistas, assistentes sociais, dentre outros, juntos a nós professores, no atendimento aos alunos.
Por questões ideológicas e econômicas, certamente, tudo isso acabou.
A lógica, hoje, é a de que a escola cuida do pedagógico e os outros setores da Prefeitura cuidam das outras questões que envolvem os alunos e suas famílias. Vivemos, então, num total isolamento! Não contamos com nenhum outro profissional sequer para trocar idéias a respeito do por quê do desempenho do aluno X , Y ou Z.
Idealmente deveríamos desenvolver um trabalho pedagógico assentado no coletivo da comunidade escolar, mas nos foi tirado até o tempo de 1h semanal, com o qual contávamos para fazer as reuniões pedagógicas internas. Trabalhamos de segunda à sexta-feira sem ter a menor noção do que acontece na sala de aula vizinha à nossa. E pensar que vivemos em plena era da comunicação, pretensamente, com todos os recursos comunicativos adivindos daí à nossa disposição.
Pois, sim!

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Lúcia Monteiro Casasanta: A MESTRA MAIOR.

No dia 29 de maio de 2008 fez cem anos do nascimento de uma grande educadora mineira, a professora/doutora Lúcia Monteiro Casasanta.

D. Lúcia, como todos a chamávamos, foi uma das principais alfabetizadoras de Minas Gerais; defensora ferrenha de que se tivesse um método para alfabetizar as crianças em idade escolar e adepta do "Método Global de Contos".

Eu cheguei a conhecê-la, já velhinha, mas ainda atuando no Instituto de Educação de Minas Gerais, hoje UEMG (Universidade do Estado de Minas Gerais), quando lá fiz o Curso Normal e, em seguida, o Curso de Pedagogia concluído em 1975. Tenho um livro de sua autoria, de 1972, com uma dedicatória, dizendo textualmente: "À caríssima ...,

Contando com V. nas fileiras de frente no combate pela boa metodização da leitura.

Lúcia Casasanta.

Neste livro, intitulado "Métodos de Ensino de Leitura", D. Lúcia faz um apanhado minucioso da história da alfabetização no mundo; descreveu com detalhe cada método até então conhecido; explicitou os "prós e os contras" de cada um deles no ensino da leitura e da escrita e se posicionou a partir de argumentos muito bem elaborados e referendados pelas novidades científicas da época, em favor do "Método Global de Contos".

Logo na introdução do livro citado acima, ela afirma:

"Tenho para mim que idéias novas, propriamente ditas, não existem ou são raras.

Quando, porém, a Ciência destrinça os casos de nossa experiência comum, há que optar entre deixar que fiquem como se acham ou tentar levá-los adiante, a fim de que outros façam o mesmo.

Por isso propus-me compor as experiências que adquiri sobre o ensino da leitura desde a antiga Escola de Aperfeiçoamento, hoje, Curso de Pedagogia, no trato demorado com crianças em sala-de-aula, em pesquisas e experimentações, reportando-me com freqüência às lições de grandes mestres de outros países.

Poderá causar estranheza a pretensão de ter feito trabalho original.

Defendo-me com dizer que dois fatos contribuíram para isso: o ambiente em que se forjou, de permanente inquietação pela busca do fato científico e de seus fundamentos e o tempo que durou sua elaboração. Idéias surgiram, amadureceram e geraram outras idéias, ora dentro, ora fora da previsão científica.

Na verdade, muita coisa velha se fez nova".

Era o ano de 1972 e D. Lúcia, já em final de carreira, ainda lutava para convencer às pessoas militantes na educação, tanto quanto ela, da importância de se ter um método para ensinar a ler e a escrever, mas não qualquer método, um método com base científica de como se dá a aquisição da leitura, de como se dá o processamento do texto cognitivamente, pelo sujeito aprendiz.

Da para acreditar que ainda hoje, mais de 30 anos depois, o que mais se ouve nas escolas é a seguinte expressão: "Método de leitura?! Eu não sigo um método. Eu faço o meu método. Ou...Eu uso vários métodos! Eu uso o meu método!

Isso explica, a meu ver, o atual fracasso do ensino/aprendizagem da leitura e da escrita em nosso país.

Precisamos resgatar, urgentemente, os ensinamentos da grande mestra, Lúcia Monteiro Casasanta.

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Professor e autonomia profissional

Nós, professores, somos formados pelas universidades, públicas ou particulares; é com essa formação que nos habilitamos para desenvolver o nosso ofício: dar aulas, ensinar, ministrar conteúdos, mediar aprendizagens, interagir com os alunos, desenvolver projetos segundo os interesses imediatos dos alunos; ensinar/aprender enquanto ensinamos. As denominações às ações do professor em sala de aula são variadas e abarcam, nelas mesmas, matizes ideológicos à escolha do frequês.
Na verdade, em sala de aula, somos múltiplos: professores, pais, mães, psicólogos, médicos, dentistas, babás,assistentes sociais, policiais e muito mais. Esperam e cobram tudo do professor!Ou seja, querem que façamos aquilo que foge ao nosso papel e somos cobrados por não termos competência técnica para tal, pois se nos fixamos somente nas funções para as quais fomos contratados, somos considerados omissos, conteudistas, egoístas, de pouca visão. Por outro lado, ora esperam que desempenhemos um papel, ora outro; ora querem que tenhamos determinadas atitudes, ora outras. Um exemplo interessante a esse respeito tem a ver com o uso de livros didáticos como recursos de ensino.
Houve um tempo em que esse uso era indiscriminado e todos contávamos com o aval das Faculdades de Educação. Num período seguinte, esse mesmo uso passou a ser criticado veementemente por essas mesmas Faculdades e, usar livro didático para dar aulas, passou a ser característica de professor acomodado, preguiçoso, sem criatividade.
Agora, vários trabalhos de pesquisas dos cursos de Mestrado e Doutorado das universidades brasileiras e, como não poderia deixar de ser, das estrangeiras também, pois são as que nos influenciam sempre, têm concluído, a partir de dados comparativos, pelo avanço pedagógico dos trabalhos desenvolvidos por professores que seguem os livros didáticos ao ministrarem suas aulas. Segundo relatos desses estudos, não só o uso do livro didático com os alunos tem se mostrado positivo, como melhor ainda tem sido o desempenho escolar dos alunos daquele professor que usa o mesmo livro didático por mais de um ano seguido.
É a teoria referendando a prática e aquilo que é óbvio, penso eu.
Um professor em dupla ou até mesmo tripla jornada de trabalho, não tem a menor condição de preparar textos, ilustrados ou não, estudos desses textos e atividades práticas a respeito, da mesma forma que os autores dos livros didáticos, têm.
Então, por que não usar os livros didáticos disponíveis em todas as escolas do país, adquiridos com o nosso dinheiro, dinheiro público, com a finalidade de oferecer recursos de trabalho aos professores e a partir da escolha desses mesmos professores?
No entanto, vale alertar: se esses livros são adequados ou não ao tipo de aluno que se tem, constitui-se numa outra grave e séria discussão, que se faz urgente!

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Resiliência

A resiliência é a capacidade de adaptação dos indivíduos às situações difíceis ou estressantes; é um conceito "roubado", pela psicopedagogia, de outras ciências, da Física, me parece. Meu primeiro contato com esta idéia foi num congresso internacional de educação do qual participei e assisti a uma palestra a respeito de um autor português que discorreu sobre o tema.
Segundo esse autor, resiliência não é motivação para; não é algo que surge de dentro do indivíduo e o ajuda nas conquistas sejam elas quais forem, mas sim tem a ver com encorajamento, que é algo de fora para dentro; do outro para o sujeito.
Aplicando tal conceito às situações de sala de aula, por exemplo, compete ao professor encorajar o aluno a estudar, a fazer os trabalhos escolares, a utilizar o tempo de estudo da melhor forma possível, mesmo sob condições adversas. O próprio professor se torna resiliente quando consegue - grosso modo - transformar um limão em limonada. Será?!
Fico pensando nas minhas condições de trabalho: sala apertada, calorenta, sem visibilidade no quadro de giz, por causa dos reflexos de ambos os lados; mal ventilada; carteiras que só podem ser dispostas de um único jeito - em dupla e uma atrás da outra - ; murais laterais sem disponibilidade para uso, são insuficientes, por serem divididos entre duas professoras que usam a mesma sala; 29 alunos de idades variadas; livros didáticos inadequados ao nível de conhecimento deles; famílias que não podem, não sabem ou não querem assumir as suas responsabilidades para com os filhos; escola desorganizada pedagogicamente e... Eu, professora extremamente desencorajada com tudo isso, não sei mais o que fazer. Durante um dia escolar são tantos os conflitos e as interferências que surgem e precisam ser resolvidas! Ao final das contas, aula, aula, aula mesmo, aquela que foi pensada, planejada, preparada e até, na expectativa dos alunos deveria acontecer, pela seqüência normal dos trabalhos, acaba não acontecendo. Dá uma sensação de nada feito, de trabalho inútil, de frustração.
Fico me perguntando: voltar no dia seguinte, tentar novamente, tirar ânimo do fundo da alma, pensar em novas formas de intervenção pedagógica junto aos alunos é ser resiliente? E isso é bom?!

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Papel e Figurino

A escola é o reflexo da sociedade. Esta é uma afirmativa tão repetida que já virou clichê. Todo aquele que trabalha ou já trabalhou em uma escola percebe o quanto é real esta idéia, para o bem e para o mal. O cotidiano escolar constitui-se dos atos das pessoas que por ali circulam e todas elas refletem, nos seus atos e palavras, o mundo que as constituíram.

Todos os dias chegam, às vezes com toda a força, às vezes devagarzinho, às vezes sutilmente, as ondas dos fatos sociais em evidência . Elas invadem a escola, sem pedir licença, e podem causar danos ou benefícios dependendo de como são acolhidas e transformadas em conhecimentos organizados e sistematizados.

Estamos num período eleitoral, vários municípios vivenciam as campanhas do 2º turno. Os candidatos se expõem e são expostos na rádio, na TV e nas propagandas de rua. Não há quem fique alheio a esse movimento seja a criança em idade escolar, sejam os adultos. De um jeito ou de outro participamos e tomamos partido. Nessa altura do campeonato, poucos continuam indecisos ou "em cima do muro".

Na escola não é diferente e o conteúdo "eleição" acaba sendo escolarizado. Porém, esse é um tema espinhoso, porque envolve a responsabilidade dos profissionais da escola com a informação correta e não tendenciosa, a análise imparcial das propostas dos candidatos, a discussão do tema com os alunos a partir de todas as informações possíveis, de ambos os lados. Envolve, enfim, ética, respeito e democracia.

Sendo dessa forma, a escola "cresce" e todos aprendemos um pouco mais a respeito da arte e da beleza de se praticar a democracia.

Sendo o contrário, se o tema for tratado, pela escola, de forma inconseqüente e/ou tendenciosa, provoca em quem participa e se preocupa com a seriedade do fato, uma sensação de desconforto. É como vestir um figurino inadequado ao papel que se representa naquele local.

O que fazer se a você for dado o papel de mero espectador? Omitir, denunciar, ou se sentir um "zero à esquerda"?

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Escola Desconectada II

Hoje, à entrada do 1º turno, ouvi um comentário na sala dos professores de que teríamos a simulação de um debate eleitoral entre os "candidatos-alunos" de uma das turmas da escola; cada um se fazendo passar pelos respectivos candidatos oficiais à Prefeitura de Belo Horizonte. Tudo bem, é legítimo, é válido pois estamos no "clima" de eleição e os alunos envolvidos nele.
Porém são crianças e pré-adolescentes e, por isso mesmo, deveriam ter sido trabalhados previamente, para o evento em si, a partir de discussões em sala de aula, a respeito da vida pregressa dos candidatos e principalmente a respeito das responsabilidades das pessoas que assumem a função pública de Prefeito.
Nada disso foi feito, a possibilidade do "debate" sugiu de afogadilho, de improviso, sem planejamento, sem organização, sem combinar com as outras turmas e sem pedir a participação de todos nessa organização.
Ficou determinado que o debate aconteceria hoje, às 10h20min, bem no horário da aula de Educação Física da minha turma e da turma de uma outra professora.
Não deu outra, reclamação e choradeira dos alunos das duas turmas que não queriam, de forma alguma, ceder o horário e o local da aula de Ed. Física, para a realização do debate. Num primeiro momento reclaram comigo e à hora do recreio fizeram a mesma reclamação com a Diretora da Escola.
A Coordenação Pedagógica, então, propôs uma alternativa de uso de um outro espaço e da divisão do debate em duas etapas: uma que aconteceu hoje para os alunos menores e outra que será amanhã para os alunos de 11/12 anos.
Todos contentes, o debate de hoje transcorreu bem com a participação animada dos alunos e torcidas ferrenhas para ambos os candidatos...
Na prática, meus alunos fizeram valer a política da conversa, do acordo, do consenso e, em síntese, viveram, mesmo sem nenhum planejamento prévio, a prática da democracia.
Pergunto, então: se sem planejamento, sem organização prévia, tudo correu bem, imagina o que poderíamos ter pensado e posto em prática, tendo um planejamento coletivo desse trabalho?

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Escola Desconectada

Cheguei à escola e , como sempre, fui direto à minha sala, porque gosto de separar todo o material a ser utilizado nas aulas do dia, antes da chegada dos alunos. Estava curiosa também para observar as mudanças ocorridas com as plantinhas do "Terrário", (citado em outro post) durante a semana do recesso escolar. Qual não foi a minha surpresa, seguida de decepção, quando me deparei com um litro d'água colocado lá dentro, bem em cima de uma cova, onde plantamos a semente de jatobá. Ela ainda não tinha germinado e por isso, entramos em recesso escolar curiosos , porque queríamos saber se aquele ambiente criado por nós, alunos e professora, estaria adequado à germinação de uma semente tão maior que as sementes de tomate e boca-de-leão plantadas, e já grandinhas, desde a semana passada.
Embora tivéssemos tido o cuidado de deixar uma placa informando do objetivo do terrário e pedindo para que ele não fosse tocado, não foi o suficiente. Alguém, talvez até bem intencionado, retirou a cobertura em plástico-filme, da parte superior do terrário e introduziu dentro dele um elemento estranho às observações que já tínhamos começado a fazer.
Fiquei pensando... Quando uma escola não se organiza pedagogicamente, não conecta todos os seus profissionais (professores ou não) às suas metas educacionais, aos seus projetos pedagógicos ou projetos de trabalhos, possibilita esse tipo de acontecimento narrado acima. Isso porque favorece a que cada profissional desenvolva ali suas atividades sem o devido conhecimento daquilo que está sendo trabalhado pelos outros profissionais; e se ninguém conhece o trabalho do outro, cria-se, assim, uma situação de distanciamento dos objetivos pedagógicos gerais e/ou de cada um. Então tudo fica mais difícil, porque mesmo com a intenção de ajudar, se a pessoa desconhece o por quê das atividades em desenvolvimento, pode interferir de forma negativa ou, pior ainda, pode nem valorizar o trabalho que está sendo desenvolvido em cada sala de aula.
Uma escola assim nos remete à idéia de um arquipélago; cada sala de aula é uma ilha e sem nenhuma ligação com as outras que compõem o mesmo ambiente.

sábado, 18 de outubro de 2008

O Terrário

Após o recesso escolar retorno 2ª feira à sala de aula; teremos aulas até 16 de dezembro e encerraremos este ano letivo. Serão praticamente mais 50 dias de aula! Pouquíssimos dias para uma enormidade de conteúdos a serem trabalhados... Como já disse anteriormente, trabalho com livros didáticos e gosto dessa prática embora saiba que muitos da tribo preferem "fabricar" seus recursos pedagógicos, textos principalmente, selecionando-os de outras fontes.
Como não quero inventar a roda todos os dias e não sou especilista de todas as matérias que leciono faço uso dos livros didáticos da melhor forma que posso.
No semestre passado, estudamos várias unidades sobre os seres vivos, as relações existentes entre eles, seus ecossistemas, preservação do meio ambiente dentre diversos outros conceitos pertinentes à área das Ciências Naturais ou da Natureza. Ao final dessa unidade o autor do livro didático adotado por mim, sugere a construção de um "Terrário", para ficar exposto em sala e servir de meio a observação do desenvolvimento da vida ali naquele ambiente artificial, posto que criado por nós, no caso, meus alunos e eu.
Arranjei uma forma de todos participarem dessa construção; seguindo a orientação dada pelo autor do livro, listei as várias tarefas e os vários materiais necessários à feitura do terrário; dividi estas tarefas entre os alunos mediante sorteio; dessa forma todos puderam contribuir com alguma coisa; a mim, coube levar para a escola um recipiente de vidro, em boas condições, de um velho aquário desativado em minha casa e que fora do meu filho mais velho; levei também os materiais mais difíceis de os alunos conseguirem por eles mesmos; no mais, cada um pode levar das sementes a serem plantadas ao paninho e detergente líquido para a limpeza do recipiente, antes da montagem do terrário.
Assim, na seqüência sugerida pelo autor do LD (livro didático), cada dupla de aluno sorteada foi executando a sua tarefa até o final quando cobrimos tudo com o papel filme, última etapa da construção. Deixamos ali plantadas sementes de: tomate, boca-de-leão, capitão, jatobá, pinheiro brasileiro e cravo-rosa (ao todo três espécies de plantas de pequeno porte e duas de grande porte; sementes grandes e sementes pequenas, miúdas). Deixamos o terrário na janela da sala, sobre uma banqueta de cimento, onde recebe a luz do sol, logo no comecinho da manhã. Os alunos ficaram muito entusiasmados com essa atividade, orgulhosos mesmo! Uma semana depois, puderam ver, com alegria, que as primeiras sementes começavam a germinar, as de tomate. Foi uma vibração total. Várias observações surgiam espentaneamente: fessôra, por que que tá molhado! Parece que o vidro tá suando! Antes mesmo que eu começasse a responder um outro já tomava a minha frente e dizia: "Oh! Sô. Num tá veno que o sol esquentou a água que tá lá no potinho que nóis dexou lá dentro! Então, ela virou vapor e num saiu porque tá tudo tampado! É assim que vai ficar, tudo molhado e a gente num precisa jogá água nas semente plantada!
Pois é, estamos observando semanalmente, (diariamente por que todos os dias a primeira coisa que eles fazem é observar o terrário) mas é semanalmente que fazemos observações dirigidas por mim e concomitantemente vou escrevendo no quadro e todos copiam em seus cadernos de Ciências, o resultado da observação: o que mudou, qual planta já germinou, o que está acontecendo com a água deixada no meio do terrário em um potinho de plástico, etc.
Segunda-feira, tenho certeza, a primeira coisa que farão ao entrar para a sala, será correr para o terrário e ver o que aconteceu às plantinhas que já estavam bem grandinhas quando entramos em recesso escolar, mas nem todas tinham germinado ainda. Será que as sementes de jatobá, de capitão e de pinheiro-brasileiro irão germinar? Eu também estou curiosa...

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

O primeiro interlocutor

Faço questão de repercutir, nesse espaço, o primeiro comentário recebido a respeito das postagens que tenho feito até o momento. Isto porque sinto nele o pulsar inicial de uma rede de interlocuções e, a partir dela, o iniciar de idéias e ações em favor do que é urgente fazer, a meu ver, pela educação pública (no meu caso) e pela saúde pública, no caso dele - Leonardo, médico recém-formado e, por coincidência, atendendo à mesma população que eu, na Região do Barreiro.

Leonardo faz constações, no atendimento aos seus pacientes, semelhantes às que venho observando, no meu tempo de trabalho em escola da mesma região.

A primeira delas é que os alunos mais novos demonstram gostar e esperar mais da escola do que os mais velhos, que na medida em que crescem se desiludem com a escola e passam a vê-la somente como lugar para merendar. Por que será?

Outro aspecto ressaltado por ele e que eu também percebo diz respeito à desestruturação das famílias das crianças e/ou adolescentes atendidas.
Todos sabemos que o conceito de família mudou muito e são várias as situações relacionais vividas pelas crianças e adolescentes atuais. Porém, quando falamos da desagregação familiar, não estamos fazendo nenhum juízo de valor à essa ou àquela família, seja a tradicional pai, mãe e filhos; ou, mãe solteira cuidando do filho e vice-versa, ou crianças sendo cuidadas por avós, tios, primos ou vizinhos... O problema maior é o do abandono afetivo dessas crianças e adolescentes, abandono esse muito maior e mais danoso do que as outras carências experimentadas por elas/eles.

A minha preocupação, e Leonardo expressa isso também no comentário que fez, é com a falta de perspectiva de futuro que essas crianças/adolescentes demonstram ter; são meninos e meninas num começo de vida sem sonhos. Quando pergunto a eles o que desejam como profissão a resposta que trazem na ponta da língua é a de ser jogador de futebol os meninos e as meninas "ser modelo" algumas e a maioria nem resposta tem. Um outro fator que me intriga muito é o de perceber neles a satisfação com o que já alcançaram em termos de aprendizagem. Para eles saber decifrar o texto já é leitura e escrever algumas palavras ou frases, por mais simples que sejam, já está bom demais. Não querem e não esperam mais do que isso da escola. Penso que aí está refletida uma característica da sociedade brasileira: a de não valorizar a educação formal. Por isso, as frases repetidas à exaustão: "escola é chato"; "estudar não vale a pena"; fulano não estudou e nem por isso morreu de fome" etc, etc, etc.
Daí a necessidade, a meu ver, de um envolvimento total de todos nós numa super valorização da escola: de acolhimento, de interesse pelo que acontece nas salas de aula, de "glamourização" do ato de estudar, de tornar a escola visível. Quem sabe, dessa forma, os pais não se interessariam mais pelo estudo dos filhos, não se sentiriam orgulhosos do sucesso deles - como no "Soletrando" do Luciano Ruck, por exemplo! Seria mais ou menos assim: "Minha escola está na Globo, logo ela existe e eu existo também"!

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Quais são os seus referenciais teóricos?

Recentemente fui instigada a responder à questão do título acima e confesso que fiquei meio embasbacada. Não que eu não tenha uma base teórica ou uma informação teórica a respeito da minha profissão. O próprio fato de eu ser graduada já é indício de algum referencial teórico visto que todo curso de graduação é formatado a partir das teorias nacionais e estrangeiras , pilares das aulas a serem ministradas pelos mestres/doutores , das respectivas disciplinas do curso.
Porém, penso que todos nós, profissionais da educação ou não, somos um todo teórico formados por partes das diversas teorias que nos formaram e nos formam ao longo dos nossos estudos acadêmicos ou não. A vida, a prática, a experiência também nos forma. Nesse sentido, somos polifônicos. Nos caracterizamos profissionalmente a partir dos diversos autores dos dicursos e dos textos lidos e/ou ouvidos enquanto nos fazemos profissionais e na prática do nosso ofício.
Sendo assim, nós professores podemos nos dizer "paulofreirianos", "magdarianas", "marcuschirianos", "casasantariana", (professora/autora alfabetizadora que respeito muito pelo que produziu teoricamente para o ensino da leitura e da escrita, enquanto viveu) dentre outros. Cito alguns autores nacionais sabendo que todos eles "beberam" em fontes estrangeiras e se constituíram teoricamente nelas.
O que eu quero dizer, no entanto, é que cada professor certamente tem a sua teoria educacional construída a partir da sua vida acadêmica e, posteriormente, segundo o seu local de trabalho e conforme as oportunidades que tem na formação continuada. Enquanto estudamos e quando já estamos no exercício da nossa função lemos vários autores; geralmente os autores "da moda" tornam-se modelos de reflexão sobre a nossa prática, mas nem todos seguimos uma linha única de pensamento. Eu prefiro ser eclética. Leio os autores que tenho a oportunidade de ler e me dou o direito de me transformar e/ou transformar a minha prática em função de tais ou quais teorias de ensino ou educacionais estudadas.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Livro didático,você usa?

Sou do tempo em que os alunos das escolas públicas não podiam comprar ( e ainda não podem) toda a lista do material didático a ser usado por eles e entregues pelas escolas aos seus pais, ao final do ano letivo, no ato da renovação da matrícula. Essas listas continham não só o número de cadernos necessários aos estudos, como também a quantidade de lápis de cor e de escrever, régua, borracha, transferidor,apontador, cola, tesoura sem ponta e os livros didáticos de cada matéria: geralmente o livro de Português, o de Matemática, o de Ciências, o de Geografia e o de História. Estou falando das turmas do ensino fundamental, 1ª à 8ª séries.
Algumas escolas pediam também um dicionário pequeno e um livro de literatura (título previamente escolhido conforme a faixa etária do aluno e o gosto da professora). Ah! Os livros didáticos eram escolhidos pelos professores! Após as férias de julho, as editoras de livros didáticos, interessadas em vender seus livros, visitavam as escolas, deixavam exemplares dos diversos autores, para serem analisados pelos professores. Eram livros de todas as diciplinas e de todas as séries. Recebíamos várias coleções de praticamente todas as editoras de Belo Horizonte e até de outros estados. Reuníamos, analisávamos todos os livros recebidos e escolhíamos aqueles que achávamos serem mais adequados aos nossos alunos, pois estavam de acordo com o seu nível de aprendizado; com os livros de literatura era a mesma coisa; podíamos, assim, fazer uma seqüência mais natural de trabalho, pois sabíamos que esse ou aquele livro didático, da editora tal ou qual, nos atenderia perfeitamente. Nós,invariavelmente, recebíamos treinamento, por parte das editoras, para o trabalho a ser desenvolvido com o livro escolhido.
Atualmente os alunos recebem todos os livros didáticos e um "Kit" de material escolar, do governo federal e municipal. O trabalho da escolha dos livros didáticos e de literatura a serem utilizados com os alunos saiu das mãos dos professores. Existe uma comissão governamental que faz isso por nós. Assim que recebemos a lista de livros a serem "escolhidos" sabemos de antemão que os mesmos já passaram por um crivo dos especialistas do governo. E os livros de literatura? Esses vão diretamente, na forma de um "Kit", para as mãos dos alunos. O professor sequer é informado a respeito das obras enviadas ou recebe também o seu pacote, para então desenvolver o trabalho literário, ao longo do ano letivo, com os alunos.
Quais são as conseqüências disso, então? Recebemos livros que não conhecemos previamente, que não folheamos, que só soubemos deles através de uma resenha e de uma classificação feitas pela comissão citada. Assim, no momento mesmo do trabalho com o aluno, é que tomamos conhecimento do conteúdo do livro "escolhido" e é aí que sentimos a inadequação do mesmo, para o tipo de aluno que temos. Só nos resta, então, fazer adaptações, complementar com outros materiais; se textos, geralmente xerocados, ou, pior ainda, simplesmente deixar o livro de lado, por inadequado que é... E haja desperdício do dinheiro público!
Penso que caso os senhores deputados e senadores queiram fazer uma inspeção nas escolas uma "CPI do uso do livro didático" ficarão estarrecidos ao se depararem com pacotes e pacotes fechados de livros novinhos e jogados pelos cantos das escolas públicas de todo o país.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Especialista ou Generalista?

Em fevereiro de 1995 a Rede Municipal de Ensino da Prefeitura de Belo Horizonte iniciou o ano letivo sob a égide da chamada "Escola Plural". Costumo dizer que "dormimos escola tradicional e acordamos escola plural". Deixamos de ser escola seriada e nos tornamos "escola por ciclos de formação"; deixamos de ter a reprovação ao final de cada série e passamos à promoção automática; deixamos de ter um currículo como referência para os planejamentos de ensino e passamos a nos guiar por "eixos temáticos"; deixamos de ter o supervisor pedagógico ou o coordenador pedagógico ( função exercida mediante concurso público) e passamos a ter o coordenador eleito por seus pares; deixamos de ser especialistas e nos tornamos generalistas. Todos nos tornamos professores alfabetizadores. Não "dávamos aulas", mas passamos a trabalhar com a "Pedagogia de Projetos" ; atendíamos aos interesses imediatos dos nossos alunos e assim "os conteúdos seriam trabalhados naturalmente", não importando o rumo que viessem a tomar.
Até então, na escola seriada, o ensino fundamental se subdividia em: 1ª à 4ª série - alunos de 7, 8, 9 e 10 anos; 5ª à 8ª série - alunos de 11, 12, 13 e 14 anos. Havia um regimento interno comum a todas as escolas da rede, que dentre outras coisas, previa a retenção do aluno ao final de cada série, caso não alcançasse um mínimo de 60% dos 100 pontos distribuídos ao longo do ano letivo, em avaliações formais e bimestrais.
Os professores eram contratados mediante um concurso público específico para cada etapa do ensino (1ª à 4ª séries, professores denominados P1, formados no ensino médio, Curso Normal); (5ª à 8ª séries, professores concursados, denominados P2, com habilitação específica para a sua área de ensino: graduados em Matemática, em Letras, em Geografia, em História e/ou Biologia) para trabalhar respectivamente as disciplinas afins.
Com o advento da "Escola Plural", tudo isso mudou. Houve a isonomia salarial e a divisão do ensino fundamental em "Ciclos de Formação". Assim, alunos de 6,7,8 e 9 anos - 1º ciclo, alunos de 9,10,11/12 anos, 2º ciclo, alunos de 12,13,14/15 anos 3º ciclo. Ao se transformar a seriação em ciclos de formação instituiu-se também uma espécie de limbo para os alunos da antiga 5ª série; eles passaram a ser denominados de pré-adolescentes do final do 2º ciclo e, dependendo da escola em que estudavam/estudam, ora eram/são alunos de professores especialistas, ora alunos de professores generalistas. Na escola onde trabalho, eles são atendidos pelo antigo professor P1, hoje "Professor Municipal", graduado, concursado, mas não especialista na disciplina de ensino. Geralmente são formados em Pedagogia, ou em Letras; poucos em Matemática; pouquíssimos em Biologia, por exemplo.
Eu sou um exemplo claro dessa situação. Minha formação é em Pedagogia e em Letras. Trabalho com alunos da antiga 5ª série e ministro aulas, para essa turma de: Língua Portuguesa, Matemática, Geografia, História e Ciências. Adoto os livros didáticos específicos para os alunos de 5ª série (os livros vêm com essa terminologia porque não existem "livros específicos para ciclos de formação").
Sinto dificuldade em trabalhar os conteúdos para os quais não tenho uma formação específica. É evidente o quanto o trabalho fica superficial, mesmo seguindo o livro didático, quase que como uma "Bíblia". Meu foco, então, dada a minha formação, é em leitura e compreensão destes textos, mas o aprofundamento no estudo de cada conteúdo de ensino ou até mesmo a exploração minuciosa do que propõem os autores dos livros didáticos adotados fica prejudicada pela falta do conhecimento específico da disciplina, que não tenho.